Paraná ganha unidade da Fiocruz e planta industrial para kits de diagnóstico
Com o propósito de reduzir a dependência brasileira de importações e ofertar kits de diagnóstico para diferentes programas do Ministério da Saúde, será inaugurada, nesta terça-feira (4), a Planta de Insumos para Diagnósticos em Saúde – uma moderna planta industrial de biotecnologia, com 2 mil metros quadrados, localizada no Paraná. Ela foi projetada com base no conceito de multifuncionalidade, ou seja, permitirá realizar, no mesmo espaço, atividades de desenvolvimento, inovação e produção de insumos para kits de diagnóstico, com tecnologias de fronteira e total aplicabilidade aos programas do Sistema Único de Saúde (SUS). Na mesma ocasião, também será inaugurado o Instituto Carlos Chagas (ICC), unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Paraná, e serão formalizadas cooperações técnicas e científicas com diferentes universidades paranaenses. O evento contará com a presença do ministro da Saúde, José Gomes Temporão.
Iniciativa vai fortalecer o SUS
A planta é fruto de um consórcio tecnológico que envolve duas unidades da Fiocruz – o ICC e o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Biomanguinhos) –, a Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) e o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), com o patrocínio do Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, e do Governo do Paraná. O operador da planta será o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), uma associação civil de direito privado, de interesse comunitário, sem fins lucrativos, criado por meio de uma parceria da Fiocruz com o Governo do Paraná, por intermédio do Tecpar.
Esta planta já recebeu investimentos da ordem de R$ 15 milhões em obras e equipamentos. Esta infraestrutura começará a ser utilizada, ainda este ano, na produção de insumos para o kit brasileiro NAT HIV/HCV, teste molecular para detecção dos vírus da Aids e da hepatite C. Ele será usado na triagem de bolsas de sangue na hemorrede nacional, ou seja, a nova tecnologia, genuinamente brasileira, vai trazer mais segurança para as transfusões sanguíneas. Isso porque o NAT, se comparado ao teste tradicional, tem a vantagem de reduzir a chamada janela imunológica – período em que já ocorreu a infecção, mas o vírus ainda não é detectado no exame de sangue. Com o novo kit, a janela imunológica para a detecção do vírus da Aids, que hoje é de 21 dias, cairá para oito dias. No caso do vírus da hepatite C, o tempo será reduzido de 72 para 14 dias. Estas reduções são possíveis porque o NAT detecta o material genético dos vírus, enquanto o teste tradicional depende do surgimento de anticorpos.
A planta também poderá realizar, em breve, a produção de insumos para diagnóstico molecular da influenza A (H1N1). Os pesquisadores estão validando uma tecnologia nacional para a produção dos principais insumos que compõem o kit de diagnóstico. Tais insumos, chamados primers e probes, são necessários à realização de PCR em tempo real – técnica utilizada para detectar o material genético do vírus influenza A (H1N1) nas amostras dos pacientes. No momento, os pesquisadores se preparam para avaliar a sensibilidade e a especificidade dos reativos que estão em fase de testes. Se os resultados forem satisfatórios, os kits de diagnóstico fornecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) poderão ser substituídos por similares nacionais, o que significará maior autonomia para o sistema de saúde brasileiro, economia de recursos públicos e ampliação da capacidade de análise de amostras.
Outros produtos, já em fase avançada de desenvolvimento, entrarão no portfolio da Planta de Insumos para Diagnósticos em Saúde, com destaque para o multiteste em plataforma de microarranjos líquidos. Trata-se de um novo sistema de diagnóstico molecular capaz de testar, ao mesmo tempo, até 100 doenças em até 100 indivíduos. E os resultados ficam prontos em cerca de 30 minutos. Inicialmente, o multiteste se concentrará no diagnóstico de HIV 1/2, HTLV I/II, sífilis, doença de Chagas e hepatite B – doenças que podem ser transmitidas pelo sangue e, portanto, são de grande interesse para a hemorrede brasileira.
Dengue e células-tronco estão entre os projetos da Fiocruz no Paraná
O Instituto Carlos Chagas (ICC), nova unidade da Fiocruz no Paraná, ocupa uma área de 2,4 mil metros quadrados, com possibilidades de expansão para 4 mil metros quadrados, no curto-médio prazo. Nesse espaço, funcionam atualmente oito laboratórios: Bioinformática; Biologia Celular e Microscopia; Biologia Molecular de Tripanossomatídeos; Virologia Molecular; Regulação da Expressão Gênica; Genômica Funcional; Células-tronco; e Laboratório de Desenvolvimento de Insumos. Além das facilidades para as atividades de pesquisa correntes, o ICC conta com um laboratório de Nível de Biossegurança 3 (NB-3), numa escala que vai até 4, e recebeu investimentos para a instalação de novas plataformas tecnológicas.
Dengue é um dos temas de pesquisa do ICC
Hoje, à plataforma de microarranjos, somam-se as de sequenciamento de DNA, espectrometria de massa (método para identificar os diferentes átomos que compõe uma substância), microscopia confocal (técnica na qual um pequeno ponto é iluminado e observado de cada vez, de modo que uma imagem é construída por meio da varredura ponto-a-ponto do campo) e citometria de fluxo (técnica para contar, examinar e classificar partículas microscópicas suspensas em meio líquido em fluxo). Para citometria de fluxo, o aparelho FACS ARIA 2 instalado no ICC é, hoje, único no Brasil. Todas essas facilidades de pesquisa são aproveitadas em diferentes frentes de trabalho do ICC, que coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) em Diagnósticos para Saúde Pública, uma rede multi e interdisciplinar composta por nove instituições entre universidades e institutos de ciência e tecnologia.
Na área de virologia do ICC, por exemplo, destacam-se os projetos sobre dengue e hantavírus. Há estudos sobre os mecanismos das doenças, medicamentos antivirais, a filogenia (relações de parentesco) dos vírus e sua epidemiologia molecular, bem como sobre kits de diagnóstico. No caso do hantavírus, já foi desenvolvido um kit de diagnóstico que está sendo produzido no ICC e distribuído para os Laboratórios Centrais de Saúde (Lacens) de vários estados pelo Ministério da Saúde.
Já a pesquisa básica com células-tronco adultas visa elucidar os mecanismos de diferenciação destas células em células cardíacas. O Trypanosoma cruzi, protozoário causador da doença de Chagas, também tem sido alvo de vários projetos, com o intuito de estudar o processo de diferenciação deste parasito e seus mecanismos de interação com as células do hospedeiro. Neste caso, utiliza-se uma abordagem de genômica funcional, onde se investiga a expressão temporal de genes do parasito e do hospedeiro, com o objetivo de identificar novos alvos potenciais para drogas contra a doença de Chagas.
Para a realização destas e de outras atividades, o ICC tem, atualmente 12 pesquisadores da Fiocruz em um universo de cerca de 100 colaboradores, entre pesquisadores, técnicos e estudantes, destacando-se a existência de 26 doutores e 15 mestres na equipe. A formação de recursos humanos é uma preocupação do ICC, que planeja para 2010 o lançamento de um curso de pós-graduação (mestrado e doutorado) em biociências e biotecnologia. Também estão nos planos da unidade parcerias com países do Cone Sul.
Intercâmbio também com universidades
Nesta terça-feira (4/7), além da assinatura dos acordos para a instalação da Fiocruz no Paraná e para a formação do consórcio tecnológico para a gestão da Planta de Insumos para Diagósticos em Saúde, também será celebrado um acordo entre o ICC/Fiocruz, a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná, o Tecpar e seis universidades estaduais: a Universidade Estadual de Londrina, a Universidade Estadual de Maringá, a Universidade Estadual de Ponta Grossa, a Universidade Estadual do Oeste do Paraná, a Universidade Estadual do Centro-Oeste e a Universidade Estadual do Norte do Paraná. O objetivo central é a cooperação institucional para o desenvolvimento científico e tecnológico do Estado do Paraná, no campo das biociências e da biotecnologia em saúde. O acordo abrange a formação de recursos humanos em nível de pós-graduação strictu sensu; o desenvolvimento conjunto de programas de pesquisa em áreas prioritárias de saúde; o desenvolvimento tecnológico de produtos e insumos de interesse dos programas de saúde pública; e o intercâmbio de pesquisadores.