Identificados polos magnéticos isolados
Os ímãs são exemplos notáveis de imparcialidade ─ cada polo norte é invariavelmente acompanhado por um polo sul para contrabalançar. Divida um ímã em dois, e o resultado é um par de ímãs perfeitamente neutros, cada um com seu norte e seu sul.
Por décadas os pesquisadores procuraram a exceção a essa regra de equidade e equilíbrio: o monopolo magnético. Resposta do magnetismo à eletricidade e ao elétron carregado negativamente, um monopolo seria um portador flutuante do norte ou do sul magnéticos ─ um yin separado de seu yang.
Dois artigos publicados on-line no início de setembro na Science apresentam evidências experimentais de que esses monopolos de fato existem, embora não como partículas elementares semelhantes ao elétron, um sinal que os desqualifica de serem considerados monopolos genuínos.
Os dois estudos examinam o comportamento magnético de uma família de compostos de terras-raras, chamados de gelos de spin ─ um grupo utilizando titanato de hólmio, e o outro, titanato de disprósio. Os gelos de spin sintéticos têm esse nome por sua semelhança com o gelo de água ─ no nível molecular sua estrutura magnética interna é análoga ao arranjo dos prótons no gelo.
Claudio Castelnovo, pós-doutorando em física da Universidade de Oxford, coautor de um dos artigos da Science, além de ter escrito um artigo na Nature no ano passado descrevendo como os monopolos podem ser identificados em gelos de spin, explica que os compostos oferecem uma combinação peculiar de ordem e liberdade que facilita a dissociação dos polos.
Em temperaturas baixas ainda há um certo espaço para oscilações magnéticas na estrutura cristalina do gelo de spin, mas não muito ─ pode-se dizer que a liberdade magnética do sistema é frustrada. “Como resultado, essa é uma substância que tem graus de liberdade que, microscopicamente, se assemelham aos de um ímã de geladeira”, observa Castelnovo. “Mas um ímã de geladeira consegue se organizar de modo a se comportar como ímã de geladeira, ou seja, ser atraído por metais, enquanto o gelo de spin não é capaz de atingir esse nível de organização, por ser frustrado, apesar de ter a mesma estrutura interna.”
Internamente, os minúsculos componentes magnéticos se arranjam em linhas como setas uma atrás da outra, como imãs em barra espalhados sobre uma mesa em diferentes direções. Em amostra muito fria e limpa, essas cadeias formam circuitos fechados. Mas a excitação induzida pelo aumento de temperatura pode introduzir pequenos defeitos nas cadeias, destaca Castelnovo ─ no análogo dos ímãs em barra, um dos ímãs gira, quebrando a continuidade ponta-cauda da seta. “A sequência normal é norte-sul-norte-sul, e em certo ponto uma das minúsculas agulhas gira 180° e passa a apontar para o lado oposto”, explica ele.
Em cada lado da falha, imediatamente, surge uma concentração de cargas magnéticas – dois nortes de um lado, dois polos sul do outro. Essas concentrações podem flutuar livremente ao longo das cadeias, agindo como… monopolos magnéticos!
“A beleza do gelo de spin é que o grau de desordem remanescente nessa fase de baixa temperatura torna esses dois pontos independentes um do outro, não importando o fato de eles se atraírem ─ do ponto de vista magnético ─, por um ser norte, e o outro, sul”, esclarece Castelnovo. “No entanto, estão livres para se mover como quiserem.”
É claro que esse método de criar monopolos sintéticos não pode produzir um norte sem gerar também um sul ─ o segredo é sua dissociação. “Eles sempre precisam surgir em pares”, comenta Castelnovo, “Mas não precisam estar em nenhuma posição específica um em relação ao outro”.
Mas Kimball Milton, físico da University of Oklahoma, autor de um artigo de revisão que resume a situação atual da busca pelo monopolo, publicado em 2006, não está convencido. Segundo Milton, “esses não são monopolos magnéticos”.
“Discordo dos pesquisadores que os chamam de ‘monopolos magnéticos genuínos’, pois para mim, genuíno implica em uma partícula pontual, e isso ela não é. De fato é empolgante que de alguma maneira se pareça com um monopolo, mas não é.”
Milton também acredita que está totalmente errado chamar ─ como fez o grupo de pesquisadores ─ a cadeia de magnetismo dentro dos gelos de spin de corda de Dirac, um cordão invisível com um monopolo na ponta, como foi proposto nos anos 1930 pelo físico inglês Paul Dirac. “Mas isso, só porque sou um purista”, comenta Milton.
De acordo com sua avaliação, as cordas magnéticas no gelo de spin não se encaixam na definição porque são, na verdade, observáveis e apenas carregam fluxo entre dois supostos monopolos. “Os monopolos reais, se existirem, estariam isolados, e a corda se perderia no infinito”, comenta.
“Não estou tentando de maneira alguma menosprezar o experimento ou a pesquisa”, afirma Milton. “Estou certo de que os novos estudos sempre são importantes no campo da física da matéria condensada. Eles apenas não são importantes do ponto de vista fundamental.”