Pesquisa analisa relação entre ciúme, amor e violência contra a mulher
No Brasil, a população feminina ultrapassou 103 milhões de mulheres em 2014. Uma em cada cinco, considera já ter sofrido alguma vez “algum tipo de violência de parte de algum homem, conhecido ou desconhecido”, segundo dados da Fundação Perseu Abramo. A violência traz prejuízos que não se restringem aos frutos da violência física, mas também aos que surgem em consequência de agressões psicológicas que são responsáveis por problemas como baixa autoestima, depressão, ansiedade e transtorno do pânico.
A ciência é uma aliada na busca de esclarecer fatores que se relacionam à violência contra mulher, sobretudo aspectos culturais. Ela também pode contribuir para elaborar medidas mais eficientes no combate às agressões de parceiros contra as mulheres com as quais estes mantêm relação amorosa.
Diante disso, a professora do curso de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Maria de Nazaré Pereira da Costa, desenvolveu uma pesquisa com o objetivo de testar a hipótese de que as pessoas podem atenuar o significado da violência contra a mulher quando esta ocorre em um contexto de ciúme e identificar se existe diferença nas respostas de homens e mulheres. O estudo foi uma replicação de uma pesquisa conduzida nos EUA, por Puente e Cohen (2003).
“Meu interesse começou estudando o comportamento emocional ciumento, termo que criei durante o desenvolvimento da minha tese de doutorado, para substituir o termo ciúme. Na época, identifiquei, a partir da literatura nacional e internacional, que uma parte significativa dos estudiosos afirmava que o comportamento emocional ciumento estava relacionado ao amor, embora a afirmação não viesse acompanhada de dados de pesquisas”, explica a professora Nazaré Costa, psicóloga clínica comportamental.
A pesquisadora teve contato com artigos que discutiam violência contra a mulher e incluíam o comportamento emocional ciumento como uma de suas causas. Após retornar do doutorado Maria de Nazaré deu continuidade aos seus estudos e foi uma questão de tempo unir os três temas: comportamento emocional ciumento, amor e violência contra a mulher.
De acordo com a professora Nazaré Costa, participaram da pesquisa 264 estudantes universitários, metade do sexo masculino e metade do sexo feminino. Todos os participantes responderam a um questionário sócio-demográfico e ouviram dois áudios (condições “ciúme” e “não ciúme”), porém, metade ouviu que o marido bate na esposa (situação de agressão) e metade que ele não bate (situação de não agressão).
Após escutarem os áudios, cada participante respondeu questões sobre o marido, o relacionamento e o que faria. As questões foram: a) quanto o marido: ama a esposa, deseja cuidar da esposa, quer estar junto da esposa, deseja a esposa e preocupa-se com ela; b) a reação do marido é: compreensível, justificável, aceitável e boa; c) quanto o marido é: inseguro, imaturo, tolo, estúpido, egoísta, mesquinho, vingativo, sádico, egocêntrico, marido ruim, pai ruim, homem ruim; d) quanto duraria o casamento. As últimas questões apresentavam duas alternativas em que os participantes escolheriam entre permanecer ou deixar o marido se fossem a esposa ou se fossem o melhor amigo da esposa.
“Vejo os resultados da pesquisa como um alerta para as pessoas em geral que em nossa cultura tendem a seguir regras que são consideradas normais ou corretas sem questioná-las. Recentemente escrevi para uma revista um artigo sobre o chamado ciúme ‘patológico’ e ressaltei que este tipo de ciúme pode começar como um ciúme ‘normal’ e que o ciúme não precisa ser o tempero do amor ou de uma relação a dois. Usar outros ‘temperos’ pode ser mais saudável para a sua relação. Logo, precisamos quebrar essa relação que foi criada entre comportamento emocional ciumento e amor”, ressaltou a pesquisadora.