Você consome cultura?
Apenas 40% dos moradores de regiões metropolitanas brasileiras gastam dinheiro com cultura. Foi o que constatou um estudo que levou em conta as despesas da população com diversas atividades culturais, da compra de CDs a ingressos de peças de teatro. Além do baixo consumo, a pesquisa também confirmou a tendência elitista desses produtos, que são pouco adquiridos pela parcela da população com menor renda e escolaridade.
O estudo baseou-se nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar, realizada entre 2002 e 2003 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A economista Sibelle Diniz, pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), identificou e comparou os gastos com produtos e atividades culturais dos lares de nove regiões metropolitanas – Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza e Belém – e do Distrito Federal. Características como idade, escolaridade e renda dos indivíduos também foram relacionadas aos seus hábitos de consumo.
Entre os produtos culturais considerados no trabalho estão artigos de áudio, vídeo, leitura e arte, além de ingressos de teatro, shows, cinema, museus e estádios. Instrumentos musicais, aparelhos de televisão, máquinas fotográficas e gastos com internet e TV por assinatura também foram incluídos.
A avaliação, realizada durante o mestrado de Diniz na UFMG, mostra que quem tem maior renda e escolaridade consome mais produtos culturais. Mas alguns dados surpreenderam a pesquisadora. Por exemplo: Rio de Janeiro e São Paulo, apesar de apresentarem as maiores ofertas de infra-estrutura cultural (casas de shows, teatros, museus e centros culturais) não lideram a lista de gastos, encabeçada pelas regiões metropolitanas de Salvador e Recife.
“Uma hipótese para esse cenário no Sudeste seria a maior oferta de eventos gratuitos”, sugere Diniz. “Mas alguns problemas relacionados à urbanização dessas áreas também podem estar afastando o público, como o custo do transporte e a criminalidade.”
A análise também aponta particularidades do consumo de cada região. No Norte e Nordeste do país prevalecem gastos com CDs e apresentações musicais. Já no Sul e Sudeste, embora o consumo de CDs esteja no topo da lista, há um gasto acima da média com cinema e teatro. “A oferta em cada região expressa o envolvimento de sua população com a arte”, avalia a economista. “No Nordeste, por exemplo, a música popular é muito forte na composição da identidade cultural.”
Ausência de hábitos culturais
Quanto aos 60% da população que não reservam qualquer fração da sua renda a produtos culturais, a economista não tem dúvidas: mais do que o custo, é a falta de hábito que os afasta da cultura. “A pessoa consome aquilo a que está exposta; ela não tem interesse por algo que não conhece”, justifica.
Para a pesquisadora, é preocupante o fato de mais da metade da população ter acesso somente aos produtos culturais divulgados pela grande mídia, como o rádio e a televisão. Mas a culpa não é somente do consumidor: Diniz acusa as próprias entidades culturais de serem excludentes. “As atividades culturais oferecidas muitas vezes são voltadas às classes mais abastadas. Logo, as pessoas de baixa renda não se sentem parte desse universo.”
A solução apontada pela economista para aumentar o consumo cultural dessa parcela da população inclui os produtores de cultura. “É preciso aproximar demanda e oferta, com uma política voltada para o consumidor”, sugere. Por outro lado, também seria necessário que os consumidores ampliassem os seus interesses. “Nesse aspecto, a educação faz toda a diferença”, destaca Diniz. “Se essa população recebesse uma educação artística de qualidade, talvez valorizasse um pouco mais a cultura.”