Sociedade e hierarquias na Vila de Alcântara no Século XIX

Por Silen Ribeiro 2 de julho de 2019

Texto: Silen Ribeiro

Foto: Ítalo  Santirocchi.

 

Saber ouvir e respeitar as diversas opiniões é fundamental para a construção de relações positivas entre professores e alunos. E foi também esse entendimento que fez surgir a pesquisa Sociedade e Hierarquias na Vila de Alcântara no Século XIX. “Nas aulas, escutava os lamentos dos alunos sobre a falta de documentação para produção de pesquisas de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Fomos atrás e encontramos uma vasta documentação: registros de batismo, casamento, óbito, os testamentos e os inventários post morten. Com eles, podíamos povoar a Alcântara do século XIX, desde os mais pobres até a elite econômica e política”, conta o doutor em História,  professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e coordenador do trabalho, Ítalo Domingos Santirocchi.

Mas o interesse pelo tema adveio bem antes.  “Nasceu de diversas fontes. Pelo amor à primeira vista pela cidade, quando a conheci em 2012 – sou de Minas Gerais, radicado no Maranhão há cinco anos – e pela quantidade de documentos históricos encontrados sobre o município, logo após a minha posse como professor na UFMA/Pinheiro”.

 

Para frente é que se anda

Bem, agora que você já sabe como tudo começou, está na hora de saber outros aspectos importantes do trabalho. Então, vamos lá.

 

Objetivo e colaboração

A pesquisa apresenta como objetivo mapear e inserir em um banco de dados as informações sobre a população residente na Vila de Alcântara no século XIX, utilizando como fonte os registros paroquiais presentes no Arquivo da Diocese de Pinheiro e, a partir deles, compreender as dinâmicas da sociedade alcantarense nesse século.

Mas claro que para atingir esse propósito houve expressivas colaborações. O professor Ítalo Santirocchi destaca como de fundamental importância o apoio que recebeu da FAPEMA, por meio do Edital 40/2015 Universal, tanto no financiamento dos materiais, quanto no fornecimento de bolsas para os discentes. “Em um momento em que as agências dos vários estados estão em crise, com o seu auxílio o Maranhão tem a oportunidade de despontar no cenário nacional como grande centro produtor de pesquisas científicas”.

E prossegue: “Também foram importantes para esse trabalho as parcerias com a Diocese de Pinheiro e com o Fórum de Alcântara, por meio do bispo D. Elio Rama e do juiz Dr. Rodrigo Otávio Terças Santos, respectivamente. Além disso, somos gratos também a todos os bolsistas e voluntários que atuaram no projeto”.

Ações e metodologia

De maneira muito simples, o professor Ítalo Santirocchi explica as principais ações desenvolvidas ao longo da pesquisa.  “O acervo que nos propomos a trabalhar era composto de vinte e um livros. Destes, onze são de batismo, cinco livros de casamento e quatro de óbito. Mas somente treze têm condições de serem manuseados, devido ao estado de conservação. Todos foram digitalizados e tiveram seus dados inseridos em um banco de dados Excel, somando mais de oito mil registros juntando os três tipos (batismo, casamento e óbito)”. 

Quanto à metodologia, ele esclarece que, por meio de elaboração de bancos de dados nominativos, foram associados os registros paroquiais com outros tipos de documentos pertinentes à temática proposta, a exemplo dos testamentos, inventários post morten e jornais. “Houve a aplicação de técnicas e metodologias ligadas à História Social, à Micro História, bem como à técnica quantitativa serial para análise de aspectos de longo prazo”.

Conclusões

Importantes conclusões foram apresentadas ao final da pesquisa. O professor é enfático ao citá-las: “Os registros paroquiais de Alcântara povoaram essa localidade, deram nomes aos proprietários de terras e de escravizados, aos escravos, aos índios e aos livres pobres. Eles mostram como essas pessoas estabeleciam suas relações de parentesco espiritual, montavam suas estratégias familiares para tentar subir na hierarquia social e de cor. Por meio deles percebemos como as famílias vão se deslocando para novas áreas de expansão agrícola na Baixada Maranhense, à medida que Alcântara vai saindo do circuito agroexportador”.

Contribuições

E todo esse processo, em que foram necessários estudos, disponibilidade, competência e disciplina, só poderia mesmo resultar em importantes contribuições para a sociedade. Sobre elas, o professor Ítalo Santirocchi aponta o conhecimento de como se estruturava a sociedade alcantarense no século XIX, a força de sua economia e a sua dinâmica populacional. Ademais, a pesquisa possibilitou levantar a hipótese de que a Baixada Maranhense, por ser uma área de expansão agrícola em meados do século, também se tornou compradora de escravizados após a abolição do tráfico em 1850. “Portanto, parte do fluxo não se destinou ao sudeste do Império, mas também às novas áreas de expansão agrícola dentro da província, sendo necessário redimensionar a tese de intensa “exportação” interprovincial de escravos na região”, afirma.

O que significou desenvolver a pesquisa?

“Como nos registros paroquiais estão presentes todas as camadas da sociedade, desenvolver esse trabalho significou dar nome e conhecer as histórias dos silenciados, dos marginalizados, dos dominados, dos escravizados, dos pobres, das pessoas comuns, sem perder de vista a elite, que dominava os meios de comunicação”, conclui o professor Ítalo Santirocchi.